
Um, Dois, Três e... Ore!
Um, Dois, Três e... Ore!
Santa Obsessão—Parte 5
Romanos 15.30–33
Introdução
Lembro-me de ler a história interessante de um menino chamado Gilbert. Quando tinha oito anos de idade, ele entrou para o clube dos escoteiros. Em uma das primeiras reuniões, ele recebeu uma folha com instruções, um bloco de madeira e quatro pneus pequenos. Mandaram-no levar aquelas coisas para casa e entregar para o seu pai.
Essa não era uma tarefa tão simples para Gilbert, já que ele não tinha nenhum pai em casa. Então o bloco de madeira permaneceu imóvel por semanas. Finalmente, sua mãe decidiu ajudar e o projeto começou. Sem habilidade alguma em carpintaria, ela simplesmente leu as instruções e as explicou a Gilbert e ele mesmo fez o trabalho—e ele fez com toda felicidade. Eles leram as medidas, as regras do que podia e não podia ser feito e, dentro de poucos dias, seu bloco de madeira transformou-se em um carrinho de corrida. Ele ficou meio torto, mas para ele tinha ficado bom, e lhe deram o nome de “Raio Azul.”
Finalmente, a grande noite chegou. Com o Raio Azul em sua mão e animação transbordando em seu coração, Gilbert e sua mãe foram para a corrida. Quando chegaram, ficou evidente que o carro de Gilbert era o único que havia sido feito completamente pelo garoto escoteiro. Todos os demais carrinhos haviam sido pintados com perfeição e com design sofisticado projetado para corrida. Alguns dos outros garotos riram quando viram esse carrinho bruto torto.
Gilbert, porém, não ficou intimidado e esperou sua vez. A corrida era um processo de eliminação—um carro permanecia na corrida conforme fosse vencendo. O Raio Azul continuou ganhando. Na última corrida, era o Raio Azul contra o carrinho mais rápido que Gilbert tinha visto naquela noite. Logo antes de a corrida final começar, Gilbert perguntou se poderia orar. A corrida parou. Com as sobrancelhas enrugadas e agarrando o carrinho com uma de suas mãos, Gilbert baixou sua cabeça por um longo minuto e orou ao Pai Celestial. Daí ele disse, “Estou pronto.”
A torcida gritou em animação. Gilbert ficou observando enquanto seu bloco de madeira desceu a rampa com velocidade surpreendente e cruzou a linha de chegada uma fração de segundo antes do outro carro. Gilbert pulou e gritou, “Obrigado!” enquanto a torcida gritava.
Um homem, líder do Clube dos Escoteiros, pegou o microfone e perguntou a Gilbert, “Então, Gilbert, você orou para ganhar, hein?”
Gilbert respondeu de forma surpreendente, “Ah, não, isso não teria sido justo. Eu orei para Deus me ajudar a não chorar quando perdesse.”
Eu me pergunto quanto de nossa oração é motivada pelo desejo de vencer na vida, ao invés de por desejo de sabedoria para se reagir corretamente à vida. Pergunto-me quanto da vida de oração do crente busca fazer a vida dar certo, ao invés de aprender a reagir quando ela não dá certo.
Se a vida do crente pudesse ser comparada à corrida dos meninos escoteiros, ela seria bem parecida com o Raio Azul. Não existe um crente que não seja como o carro de Gilbert—um pouco torto, meio bruto, com uma pintura desigual; tudo, menos sofisticado e impressionante. O corpo de Cristo não é composto de perfeições engenhosas, mas de blocos de madeira comuns que necessitam de modelação, ajuste e retoques.
Sinceramente, precisamos orar mais, não para chegarmos em primeiro, mas para saber como correr com um espírito de Cristo sem importar em qual posição chegamos.
Se existiu um modelo sofisticado de Cristianismo—com ótima aerodinâmica espiritual e perfeitamente equilibrado—esse modelo foi o apóstolo Paulo. Se houve alguém que sabia ganhar, foi esse advogado judeu convertido que se tornou o missionário pioneiro pela causa de Cristo.
Entretanto, vez após vez, o apóstolo Paulo implorou que a igreja orasse por ele quando ele iniciava uma nova volta em sua corrida. Paulo pediu:
- Aos efésios por oração para que ele proclamasse ousadamente o Evangelho, pelo qual sou embaixador preso em correntes. Orem para que, permanecendo nele, eu fale com coragem, como me cumpre fazer (Efésios 6.20);
- Aos coríntios, ajudando-nos também vós, com as vossas orações a nosso favor (2 Coríntios 1.11);
- Aos tessalonicenses em relação a sua equipe missionária inteira, orai por nós, para que a palavra do Senhor se propague... e para que sejamos livres dos homens perversos e maus... (2 Tessalonicenses 3.1–2);
- Aos filipenses para lembrar de que suas orações a seu favor seria a causa de sua libertação (Filipenses 1.19);
- Aos colossenses, Suplicai, ao mesmo tempo, também por nós, para que Deus nos abra porta à palavra, a fim de falarmos do mistério de Cristo, pelo qual também estou algemado (Colossenses 4.3).
Você pode pensar que as portas se abriam para Paulo automaticamente; que pregações e discursos fluíam naturalmente de seus lábios; que ele nunca se retraía em medo, mas falava normalmente com ousadia. Contudo, várias e várias vezes, Paulo ficou ao lado da pista de corrida da vida com seu carrinho azul, pronto para ouvir a largada, “Um, dois, três e...” e Paulo dizia, “Espere! Podemos orar?!”
Por quê? Será que Paulo ora para que as coisas deem certo? Claro, mas acima disso, Paulo ora no caso de as coisas não darem certo.
Paulo era obcecado com a oração pela vontade de Deus ser realizada em sua vida, não importava qual fosse.
Começando em Romanos 15.14, já descobrimos algumas obsessões de Paulo:
- A obsessão com uma vida piedosa;
- A obsessão com a glória de Deus;
- A obsessão com a graça de Deus; e
- A obsessão pela causa global de Deus.
Hoje, ao concluirmos o capítulo 15 de Romanos, descobrimos mais uma:
- A obsessão com a intercessão a Deus.
A Obsessão de Paulo com A Oração
Veja Romanos 15.30:
Rogo-vos, pois, irmãos, por nosso Senhor Jesus Cristo e também pelo amor do Espírito, que luteis juntamente comigo nas orações a Deus a meu favor,
Captamos a ideia de que Paulo não se enxerga como um herói espiritual. Ele é parte do corpo de Cristo e pede pela ajuda do corpo.
Em nosso último estudo, mencionei que essa carta aos Romanos era, dentre outras coisas, uma carta missionária na qual Paulo pede por apoio.
Anteriormente, em Romanos 15.24, ele escreveu que desejava ser por eles encaminhado. Esse verbo transmite a ideia de assistência financeira e de comida.
Agora, como qualquer carta missionária, Paulo faz pedido de oração. Contudo, ele não simplesmente pede! Suas palavras no verso 30 estão repletas de vocabulário intenso.
A palavra rogo-vos é o verbo grego parakalo, que pode ser traduzido como “eu imploro, exorto.”
Donald Grey Barnhouse disse, “Esse termo carrega a urgência de um S.O.S.”—convoco vocês a orarem por mim.
Todavia, lembre-se que a oração não é somente por minha causa, mas, no fim, conforme Paulo escreve em Romanos 15.30, por nosso Senhor Jesus Cristo e também pelo amor do Espírito.
Em outras palavras, Paulo pede por ração, mas lembra os crentes de que a verdadeira oração busca, no fim, a glória de Jesus Cristo e obedece ao chamado unificador do Espírito Santo para amarmos uns aos outros.
Paulo quer que se unam a ele pessoas que desejam ver Cristo honrado e o Espírito de Deus manifestado através do amor do corpo de Cristo.
Rogo-vos: esse é o mesmo verbo que Paulo empregou em Romanos 12.1:
Rogo-vos, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, que apresenteis o vosso corpo por sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional.
Será que é importante que o crente entregue sua vida a Deus? Não é uma opção, não é verdade?
Paulo emprega o mesmo verbo em Romanos 15.30, como que dizendo, “Orar por mim não deve ser uma opção, para a glória de Cristo e amor do Espírito.”
Mas Paulo vai ainda mais além em Romanos 15.30, dizendo que luteis juntamente comigo nas orações a Deus a meu favor
Ainda me lembro de estar na sala de parto com minha esposa quando nos preparávamos para ter nosso quarto filho. E digo “nos preparávamos” um tanto generosamente.
Se os homens tivessem que dar à luz um bebê, não haveria bebê algum no mundo! Jamais conseguiríamos aguentar toda aquela dor, isso para não mencionar as demandas físicas e pressões emocionais de carregar e depois dar à luz um filho. Esquece! Jamais conseguiríamos fazer isso!
Na sala de parto onde estávamos, jamais me esquecerei da intensidade da dor de minha esposa. Ela agarrou meu braço—o qual nunca mais seria o mesmo novamente—e olhou com seus olhos com uma mistura de dor e medo, e me disse, “Me ajuda!”
Nunca me senti tão inútil diante da terrível agonia da minha esposa como naquela ocasião.
É essa a palavra que Paulo usa no texto e que é traduzida como, luteis juntamente comigo. É desse termo, synagonizomai, que derivamos nosso vocábulo “agonia ou agonizar.” Paulo diz, “Agonizem comigo.”
Essa é a única ocorrência dessa palavra em todo o Novo Testamento, apesar de alguns derivados serem usados. Por exemplo, quando Cristo disse em João 18.36:
…O meu reino não é deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, os meus ministros se empenhariam por mim (“agonizomai”)…
Paulo usou um derivado mais curto dessa palavra em 2 Timóteo 4.7, Combati o bom combate.
Paulo não está pedindo para os crentes fazerem algumas orações rápidas a seu favor usando palavras como, “É, Senhor, por favor, abençoe o irmão Paulo lá na obra... Amém.”
Essa é a mesma palavra usada a respeito de Jesus Cristo quando Ele orou no Jardim do Getsêmani, conforme lemos em Lucas 22.44:
E, estando em agonia, orava mais intensamente. E aconteceu que o seu suor se tornou como gotas de sangue caindo sobre a terra.
Imagine isto—Paulo pede para os romanos agonizarem com Ele da mesma forma que Cristo agonizou diante do Pai.
Esse tipo de oração não se limita a cultos de oração das 7 às 8 da noite numa quarta-feira. Essa obsessão não se restringe a um boletim ou a uma lista de pedidos de oração.
Isso é disciplina espiritual; é entrar na competição da vida e toda vez que você vê a bandeira da largada, você diz, “Espere... vou orar.”
Mas eu confesso a você que meu fervor pela oração geralmente surge somente depois que o Raio Azul já passou a quinta marcha.
Sinceramente, eu acho que esse tipo de obsessão pela intercessão era o que Paulo tinha em mente quando escreveu aos crentes tessalonicenses, Orai sem cessar (1 Tessalonicenses 5.17).
Por que devemos orar sem cessar?
Para começar, para a glória de Cristo; e fazemos isso segundo a obra do Espírito Santo.
R. A. Torrey escreveu, certa vez, dez motivos por que devemos orar sem cessar. Devemos orar assim porque:
- Existe um diabo e a oração é o meio que Deus estabeleceu para resistir o diabo;
- A oração é a maneira como podemos obter o que necessitamos das mãos de Deus;
- Os apóstolos consideravam a oração como uma prioridade em suas vidas;
- A oração ocupou um lugar predominante e foi uma parte fundamental na vida terrena de nosso Senhor;
- A oração é o ministério atual de nosso Senhor, uma vez que Ele intercede por nós;
- A oração é o meio que Deus determinou para recebermos misericórdia dEle e socorro em tempos de necessidade;
- A oração é o meio de se obter a plenitude da alegria de Deus.
- A oração com ação de graças é a forma de se obter liberdade de nossa ansiedade e paz que ultrapassa o nosso entendimento;
- A oração é o meio pelo qual nos mantemos alertas;
- Deus usa a oração para promover crescimento espiritual, munir nosso serviço de poder, liderar outros à fé em Cristo e abençoar a igreja de Cristo.
Após ler uma lista como essa, a pergunta deixa de ser, “Por que devemos orar?” e passa a ser, “Como vivermos sem orar?”
Penso se Torrey não era fervoroso com a oração por causa de sua própria história. Ele nunca se esqueceu de quando numa noite, ainda um universitário em Yale, tomado de tristeza e culpa por causa de seu estilo de vida pecaminoso, ele decidiu tirar sua própria vida. Naquela noite, em 1875, ele tropeçou numa vasilha de água em seu dormitório, procurando uma gilete para cortar seus pulsos em profundo sentimento de culpa por causa de sua vida rebelde, tendo rejeitado o Evangelho ensinado por seu pai e sua mãe. Ele não conseguiu encontrar a gilete e, de repente, foi tomado com uma forte convicção para orar. Sem saber, sua mãe, naquele exato momento, foi movida em seu íntimo a se colocar de joelhos e a orar pela salvação de seu filho que morava distante dela. Naquele momento, Reuben Torrey ajoelhou-se ao lado de sua cama e entregou sua vida a Jesus Cristo.
R. A. Torrey se tornou o presidente do Instituto Bíblico Moody e, posteriormente, deão em uma universidade. Pelo resto de sua vida, ele viveu com um fervor profundo pela oração.
Os Pedidos de Oração de Paulo
Agora, assim como se espera de qualquer carta missionária, Paulo é mais específico em relação à urgente questão da oração. Na verdade, ele menciona três pedidos de oração pelos quais a igreja de Roma deveria orar.
- O primeiro pedido de oração de Paulo pode ser resumido com uma palavra: segurança.
Esse pedido de oração aparece em Romanos 15.31a: para que eu me veja livre dos rebeldes que vivem na Judéia.
Paulo era o inimigo número um do povo judeu. Sua foto estava pregada nos murais de todos os correios da cidade de Jerusalém.
Os judeus em Jerusalém já tinham matado Estêvão ao ar livre depois que ele pregou seu primeiro sermão. Eles tinham jogado Pedro na prisão, somente para depois perde-lo em uma fuga miraculosa quando um anjo veio e o libertou. O sangue dos crentes já tinha manchado o solo dentro e ao redor da cidade de Jerusalém e de outras regiões.
Paulo, o antigo perseguidor do Cristianismo, é agora o pregador mais famoso do Cristianismo. Os judeus estão furiosos com sua conversão a Cristo e com suas doutrinas desse novo organismo chamado igreja.
Paulo sabia muito bem que estava indo em direção a grandes problemas. Ele estava, na verdade, caminhando para o epicentro de um furacão.
Nesse verso, Paulo diz, “Agonizem comigo para que eu seja livrado das mãos dos judeus incrédulos.”
A palavra traduzida como livre, ruomai, significa, “ser preservado.”
Nosso Senhor usou essa palavra ao nos ensinar a orar, livra-nos do mal (Mateus 6.13).
Ela também foi empregada para descrever a redenção do crente em Colossenses 1.13:
Ele nos libertou do império das trevas e nos transportou para o reino do Filho do seu amor.
Paulo sabia que ele era um homem procurado e que, ao menos que o Senhor o protegesse, ele morreria em Jerusalém.
A evidência do ódio dos judeus contra Paulo é vista em eventos que ocorreram logo após Paulo ter chegado em Jerusalém. Conforme Atos 21, Paulo é, de fato, reconhecido por alguns judeus quando vai ao templo. Seus inimigos o veem e instigam as massas, gritando:
Israelitas, socorro! Este é o homem que por toda parte ensina todos a serem contra o povo, contra a lei e contra este lugar; ainda mais, introduziu até gregos no templo e profanou este recinto sagrado… Agitou-se toda a cidade, havendo concorrência do povo; e, agarrando a Paulo, arrastaram-no para fora do templo… [e começam a espancar Paulo] (Atos 21.28–32).
Você consegue imaginar esse motim que ferve a cidade? Paulo foi quase espancado à morte por essa corja que queria retribuí-lo por sua traição ao Judaísmo e por abertamente declarar que Jesus era o Messias. Eles o teriam matado se os soldados romanos não o tivessem resgatado das mãos dos assassinos.
Então, o primeiro pedido de Paulo foi atendido, apesar de não ter sido exatamente da maneira como Paulo esperava, e provavelmente também não da maneira como os crentes romanos tinham orado.
Esperamos que Deus responda as nossas orações por segurança de forma que não envolva espancamento a ponto de ser quase morto. Segurança geralmente não envolve experiências à beira da morte nas mãos de uma gangue sedenta por sangue.
Contudo, Deus tinha em mente a proteção de Paulo—proteção pelas mãos dos soldados romanos, os quais o guardarão em proteção atrás das grades.
Enquanto pensava nas tentativas de assassinato contra a vida de Paulo, cheguei à conclusão de que ele jamais teria sobrevivido se tivesse permanecido sob a proteção dos crentes. Seria necessária a proteção do império para defender sua vida.
Soldados romanos seriam colocados como guardas de Paulo pelo resto de sua vida. Sem eles, creio que ele não teria tido a oportunidade de escrever suas cartas e orientar a igreja com sua doutrina inspirada.
O primeiro pedido de oração foi respondido—de forma incomum. Talvez seja exatamente isso que Deus está realizando em sua vida também.
Talvez Deus está respondendo suas orações, mas de uma maneira que você não escolheu e nunca imaginou. Você jamais escreveu o roteiro que se desenrolou, mas depois de algum tempo de consideração e crescimento, por meio de lágrimas e muita luta, você começa a entender.
Agora, talvez, você começa a entender o significado de agonizar em oração.
Três amigos discutiam sobre a postura certa na oração:
O primeiro disse, “O crente deve orar ajoelhado e com a cabeça baixa em reverência.”
O segundo disse, “Não. O crente deve ficar de pé com a cabeça erguida, olhando para o céu e falando face a face com Deus.”
O terceiro se pronunciou e disse, “Não sei de nada, mas sei disto: a melhor oração que já fiz foi de cabeça para baixo quando caía dentro de um poço!”
Esse terceiro homem, de repente, entendeu o que significa agonizar em oração!
- O segundo pedido de oração de Paulo é igualmente, ou até mais, significante à causa de Cristo e ao amor do Espírito Santo do que o primeiro. O primeiro pedido tinha a ver com segurança; o segundo tem a ver com seu serviço.
Veja Romanos 15.31b: e que este meu serviço em Jerusalém seja bem aceito pelos santos.
Lembre-se de que o relacionamento entre judeus e gentios era algo abominável. No decorrer de todo o ministério de Paulo, houve judeus que nunca se convenceram, mas argumentavam com Paulo e debatiam sua insistência de que gentios não precisavam se transformar em judeus para entrar na igreja.
Então, Paulo tinha judeus descrentes tentando mata-lo e judeus crentes que o tratavam melhor. Paulo esperava que a oferta entregue à igreja de Jerusalém ajudasse a consertar essa fissura e encorajar a unidade do amor no Espírito.
Será que os judeus ficariam ofendidos? Será que pensariam que os gentios estavam se sentindo superiores com seus presentes? Será que eles pensariam que os gentios estavam tentando comprar sua simpatia? Todas essas eram possibilidades bem reais.
Meu amigo, muito disso se torna praticamente imperceptível a nós por causa do tempo, da distância e da cultura. Imagine como essa questão era difícil.
O templo dos dias de Paulo havia sido construído por Herodes o Grande. Grande parte dele era revestido em ouro. Ele ficava sobre uma plataforma de pedra conhecida como o Monte do Templo e era cercado de pórticos. A câmara mais interior era chamada de o Pátio dos Sacerdotes porque somente membros da tribo sacerdotal de Levi tinham acesso permitido. O pátio seguinte era o Pátio de Israel, no qual somente judeus homens podiam entrar. O pátio depois desse era o Pátio das Mulheres, ao qual qualquer mulher judia tinha acesso, bem como qualquer judeu em geral.
Agora veja bem isto: apesar de existirem diferenças, esses três pátios ficavam todos no mesmo nível. Contudo, isso mudava quando se saía do Pátio das Mulheres. A pessoa tinha que descer cinco degraus a uma área plana, na qual havia um muro de um metro e meio e que cercava todo o templo. Nesse muro, foram colocados portões pelos quais os judeus subiam as escadas e iam para o Pátio das Mulheres, dos homens e dos sacerdotes, nos quais nenhum gentio podia entrar.
Dessa área plana na qual havia o muro de pedras de um metro e meio de altura, a pessoa descia mais catorze degraus e chegava a outra área plana chamada de o Pátio dos Gentios. Dezenove degraus abaixo dos pátios dos judeus, no muro de pedra, havia inscrições advertindo os gentios contra a entrada nos demais pátios, conforme o historiador judeu Flávio Josefo nos informa. Eu vi fotos dessas inscrições. Uma delas foi escavada em 1871 e dizia, “Nenhum estrangeiro está autorizado a ir além deste muro e ao dique ao redor do santuário. Quem for pego será culpado por sua morte subsequente.”
O aviso era claro, “Invasores gentios serão mortos.”
Não é surpresa alguma que o judeu ortodoxo se levantava toda manhã e agradecia a Deus por não ter nascido gentio.
Agora, entretanto, esse judeu se converte a Cristo e descobre que o chão ao pé da cruz é plano. Não existem dezenove degraus na igreja separando judeus e gentios—ambos nasceram igualmente em uma nova raça, conforme vemos em 1 Pedro 2.9:
Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz;
Tudo era novidade—a graça era intimidante e o Evangelho humilhante. Será que eles aceitariam de bom grado a oferta de dinheiro de Paulo coletada de igrejas gentias?
É por esse motivo que Paulo pede aos crentes romanos em Romanos 15.31b: …[orem para] que este meu serviço em Jerusalém seja bem aceito pelos santos.
Esse pedido de oração foi respondido exatamente como Paulo esperou! Lucas registra o evento em Atos 21. Lemos:
Tendo nós chegado a Jerusalém, os irmãos nos receberam com alegria… E, tendo-os saudado, [Paulo] contou minuciosamente o que Deus fizera entre os gentios por seu ministério (Atos 21.17, 19).
Eu fiquei pensando, “Eita, Paulo, vá com calma! Não provoque!”
Não, eles precisam saber.
E Lucas relata a reação dos crentes judeus no verso 20: Ouvindo-o, deram eles glória a Deus.
O serviço de Paulo aos santos foi aceitável.
- O primeiro pedido de oração de Paulo tinha a ver com sua segurança; o segundo com seu serviço; e o terceiro pedido tem a ver com seu espírito.
Veja Romanos 15.32:
a fim de que, ao visitar-vos, pela vontade de Deus, chegue à vossa presença com alegria e possa recrear-me convosco.
De forma transparente e sensível, Paulo se refere à igreja de Roma como um porto seguro para o qual não consegue esperar poder finalmente navegar. Um autor disse:
Paulo queria, desesperadamente, ancorar no abrigo da assembleia de Roma e descansar. Ele havia deixado Éfeso em confusão; ele tinha entrado com conflito com Corinto por causa da imaturidade e pecado dos crentes; ele tinha escrito uma carta de teor severo às igrejas da Galácia... ele queria apenas descansar—passar um tempo reanimando seu espírito e recarregando suas baterias com alegria... esse era o anseio de sua alma.
Paulo seria preso em Jerusalém e, anos depois, chegaria a Roma—não como missionário pioneiro, mas como prisioneiro que se tornará um mártir para Cristo.
Como a igreja de Roma o recebeu? Eu queria poder contar uma história diferente, mas sabemos que, quando ele chegou, apenas poucos crentes vieram se encontrar com ele. Os demais crentes estavam com medo de se identificarem por causa das cadeias, dos soldados romanos e da possibilidade de perseguição.
Em sua última carta a Timóteo, Paulo escreveu sobre o medo e timidez dos crentes romanos, talvez até covardia. Ouça o que ele disse em 2 Timóteo 1.15–18:
Estás ciente de que todos os da Ásia me abandonaram; dentre eles cito Fígelo e Hermógenes. Conceda o Senhor misericórdia à casa de Onesíforo, porque, muitas vezes, me deu ânimo e nunca se envergonhou das minhas algemas; antes, tendo ele chegado a Roma, me procurou solicitamente até me encontrar. O Senhor lhe conceda, naquele Dia, achar misericórdia da parte do Senhor. E tu sabes, melhor do que eu, quantos serviços me prestou ele em Éfeso.
Então, Paulo foi reanimado no fim, mas não pela assembleia, mas por uma família que veio e o visitou, arriscando sua própria segurança.
Será que faltou alegria a Paulo? De jeito nenhum. Aquele pedido também foi respondido.
Seria em Roma, em prisão domiciliar, que Paulo escreveria a carta aos Filipenses, uma carta encharcada com alegria. Na verdade, a palavra “alegria” ocorre dezesseis vezes nessa carta.
Paulo tinha descoberto que a vontade de Deus era totalmente diferente do que tinha em sua antiga lista de oração. Ele estava disposto a deixar o Espírito de Deus mudar seu espírito, de maneira que, até mesmo em face a reveses dramáticos, Paulo, de fato, foi a Roma e encontrou alegria.
Conclusão
Paulo conclui esse parágrafo com a típica bênção judaica, na qual ele menciona a paz de Deus que colocaria judeus e gentios em um corpo harmonioso. Ele escreve em Romanos 15.33:
A paz de Deus seja com todos vós. Amém!
Permita-me fazer três observações sobre esse cenário.
- Maturidade espiritual não apaga automaticamente a dor de um coração inquieto.
Paulo estava encarando perigo, batalhas, ódio, preconceito, conflitos e possivelmente a morte. Esses sentimentos de inquietude trouxeram agonia que precisava ser compartilhada. Ele precisava da oração de irmãos—sim, orar pelo grande apóstolo Paulo.
Com maior frequência, somos tentados a usar a oração para pedir que Deus mude nossas circunstâncias, quando, na realidade, Deus está usando as circunstâncias para nos mudar.
Maturidade espiritual não apaga tempos de lutas com um coração inquieto.
- Uma vida disciplinada de oração não apaga automaticamente a possibilidade de perguntas não respondidas.
Em outras palavras, intimidade com Deus não alivia tempos de questionamentos, confusão e até de desencorajamento.
Caminhar com Deus não significa que seu carrinho Raio Azul sempre chegará em primeiro—às vezes ele chega em último. Você não consegue entender por que—e Deus escolhe não dar as respostas.
Obsessão com a intercessão é submeter-se a um Deus soberano que tem o direito de responder da maneira como bem Lhe agradar—mesmo que Ele escolha nem mesmo responder.
E. Stanley Jones escreveu:
Oração é simplesmente entrega a Deus. Se eu lançar a âncora de um barco, fincando-a à beira do rio e puxar, será que estarei puxando a beirada para mim, ou estarei me puxando para a beirada do rio? Oração não é puxar Deus para a minha vontade, mas alinhar a minha vontade com qualquer que seja aquilo que Ele deseja.
Uma vida disciplinada de oração não apaga automaticamente a possibilidade de perguntas não respondidas.
- Um compromisso de servir a Cristo não apaga automaticamente a possibilidade e de um futuro incerto.
Quando o apóstolo Paulo estava prestes para embarcar para Jerusalém, em uma cena bem comovente, ele deu adeus aos presbíteros da igreja de Éfeso. Em seus comentários finais, ele fez uma declaração poderosa:
E, agora, constrangido em meu espírito, vou para Jerusalém, não sabendo o que ali me acontecerá.
Imagine isso! “Estou indo para Jerusalém... e não sei o que irá acontecer comigo ali.”
Um, dois, três e... espere! Vamos orar antes, durante e depois da corrida.
Daí, poderemos dizer com Paulo em Romanos 15.33: A paz de Deus seja com todos vós. Amém!
Paz! Perfeita paz!
Nosso futuro é desconhecido?
Mas Jesus Cristo o conhece e Ele está no trono!
Este manuscrito pertence a Stephen Davey, pregado no dia 11/06/2006
© Copyright 2006 Stephen Davey
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