
Ilha de Refúgio
Ilha de Refúgio
Atos 28.1–10
Introdução
Da última vez que falamos com o apóstolo Paulo, ele estava nadando em direção à praia e em meio a um furacão. Duzentos e setenta e seis passageiros, agora naufragados por essa tempestade, nadavam para salvar suas vidas, enquanto outros se seguravam em destroços de madeira, deixando que as ondas os conduzissem até a praia. E, a propósito, essa praia não era uma praia conhecida; na verdade, eles saberão somente depois que chegaram à ilha de Malta.
Acho interessante que a palavra “Malta” significa, “lugar de refúgio; abrigo seguro.” Paulo e os demais passageiros sobreviveram ao naufrágio. E, agora, apesar de deitados na areia da praia extremamente exaustos e completamente encharcados e o com muito frio por causa do vento gelado que soprava, a palavra do Senhor por intermédio de Paulo havia se cumprido. Ninguém havia morrido ou se afogado no naufrágio. Todos haviam chegado são e salvos à “ilha do refúgio.”
Talvez você ache interessante saber que, em 1964, essa pequena ilha, que tem aproximadamente trinta quilômetros de extensão, ganhou sua independência da Grã-Bretanha. Muitos anos antes, contudo, vários cidadãos de Malta ganhariam independência do império das trevas pelo poder do evangelho de Jesus Cristo.
Essa ilha reserva aventuras fascinantes para Paulo e nos revelará algumas surpresas também.
Uma Revelação de Hospitalidade
Convido você a nos reunir com esses náufragos em Atos 28. Veja os versos 1 e 2.
Uma vez em terra, verificamos que a ilha se chamava Malta. Os bárbaros trataram-nos com singular humanidade, porque, acendendo uma fogueira, acolheram-nos a todos por causa da chuva que caía e por causa do frio.
Creio que uma das maiores surpresas de Paulo e dos demais foi a hospitalidade dos nativos. Cansados e encharcados depois do longo nado, Paulo e os demais sobreviventes poderiam ter facilmente morrido por causa do frio. O ventos gelados e a chuva de novembro eram seus inimigos. Tudo indica que Lucas foi tocado de forma especial pela bondade dessas pessoas da ilha, o que o levou a escrever em seu diário, como vemos no verso 2: Os bárbaros nos trataram com singular humanidade.
Essa é outra forma de dizer: “Não pude acreditar na maneira como essas pessoas trataram estranhos.”
Não se esqueça que, dentre os náufragos, havia criminosos, prisioneiros do governo vigiados por soldados. Os nativos da ilha ajudaram esses prisioneiros; eles demonstraram total hospitalidade para com estranhos.
Uma ilustração da igreja
Foi impossível para mim não pensar nessa cena como uma ilustração da igreja. Romanos 12, verso 13b, diz: praticai a hospitalidade.
Você somente pratica algo no qual pode melhorar. Então ele nos diz para praticar a hospitalidade porque ninguém é naturalmente bom nisso. Uns são melhores que outros, mas todos precisam praticar.
A palavra poderia ser traduzida como, “caçar, buscar uma oportunidade; demonstrar cuidado por outros.”
É impossível não nos impressionar com a última parte do verso 2:
...acendendo uma fogueira, acolheram-nos a todos por causa da chuva que caía e por causa do frio.
Eles fizeram isso igualmente para prisioneiros, comandantes, soldados e marinheiros. Que hospitalidade incrível!
Uma Revelação de Caráter
Note no verso 3 uma revelação do caráter de Paulo.
Tendo Paulo ajuntado e atirado à fogueira um feixe de gravetos, uma víbora, fugindo do calor, prendeu-se-lhe à mão.
Agora, a revelação do caráter de Paulo não se encontra no fato de ele ter sido mordido por uma cobra e não ter gritado ou desmaiado. Não, a revelação de seu caráter se encontra nas primeiras palavras do verso 3, onde lemos: Tendo Paulo ajuntado e atirado à fogueira um feixe de gravetos.
O que Paulo está fazendo juntando gravetos enquanto todos estão se aquentando à beira da fogueira?
Paulo se sente responsável pela segurança deles. Se forma bem prática, ele havia se tornado o líder deles. Ele deveria ser o primeiro da fila para assar um milho ou uma linguiça naquela fogueira e não estar juntando gravetos.
A verdade é que Paulo tinha caráter. Alguém escreveu certa vez: “Somente os pequenos homens recusam as pequenas tarefas.”
Paulo revela sua humildade com esse ato de serviço.
Nunca me esqueço da história de um homem que desejava desenvolver mais humildade diante das pessoas. Então, ele pegou duas placas, escreveu versos bíblicos nelas, pendurou uma na sua frente e outra nas suas costas e saiu na avenida de principal da cidade. Ele disse que, enquanto andava na rua, suportando os olhares e risadas das pessoas, ele se viu dizendo ao Senhor: “Tu sabes, Senhor, que não existem mais pessoas dispostas a fazer isso para Ti.”
Esse é o problema com a humildade. No momento em que você pensa que é humilde, você prova que não é.
Por isso é que é impossível chegarmos à humildade; nós apenas agimos com humildade. 1 Pedro 5, verso 5, diz: no trato de uns com os outros, cingi-vos todos de humildade.
A palavra “cingi-vos” se refere ao ato de você amarrar um avental de escravo ao redor da sua própria cintura ao se preparar para servir alguém.
Aqui está o grande apóstolo com o avental amarrado à sua cintura. E, no caso de você não ter notado, foi no momento em que ele estava servindo que foi mordido por uma serpente venenosa.
Interrompido pelo sofrimento
Continue nos versos 4 e 5.
Quando os bárbaros viram a víbora pendente da mão dele, disseram uns aos outros: Certamente, este homem é assassino, porque, salvo do mar, a Justiça não o deixa viver. Porém ele, sacudindo o réptil no fogo, não sofreu mal nenhum;
Agora, entre os versos 5 e 6, creio que o Dr. Lucas correu até Paulo e disse: “Paulo, está tudo bem? Espere aí, deixe-me dar uma olhada na sua mão... Hum, que estranho... sua mão não está inchada, Paulo. Está doendo? Não?! Isso é incrível!”
Essa é uma demonstração da revelação de poder predita por Cristo aos apóstolos anos antes. Eles poderiam ser mordidos por serpentes, de acordo com Marcos 16, verso 18, e não sofreriam nada.
Você pode dizer: “Quero fazer isso hoje também!”
Bom, vai em frente e pegue uma cascavél pelo rabo, mas sua história será bem diferente. Você se esqueceu – você não é um apóstolo.
Existem pessoas em movimentos que mexem com serpentes e acabam morrendo. Quase todos os anos leio casos de morte.
Essa revelação de poder validava o apóstolo de Deus que, sem a confirmação das Escrituras como teste final, poderia, assim, provar que ele vinha, de fato, da parte de Deus.
Mas, nessa ilha, as pessoas ainda estavam confusas – elas pensaram que ele era Deus. Note o verso 6.
mas eles esperavam que ele viesse a inchar ou a cair morto de repente. Mas, depois de muito esperar, vendo que nenhum mal lhe sucedia, mudando de parecer, diziam ser ele um deus.
Eles não sabem se Paulo é uma assassino ou um deus.
Você percebeu que, nessa história, Paulo foi chamado para sofrer um pouco mais ainda? Ah, a mão dele não inchou e nem ele morreu, mas imagine o choque e a dor de ter suas mãos perfuradas pelos dentes de uma serpente venenosa.
Por que Paulo teve que sofrer nesse ponto? Será que Deus já não tinha permitido sofrimento suficiente na vida do apóstolo?
Um comentarista bíblico refresca a nossa memória a respeito dos diferentes tipos de sofrimento com os quais os crentes se surpreendem e têm que suportar. Acompanhe comigo.
- Existe o sofrimento comum.
Esse é, simplesmente, o resultado do nosso pecado. Doenças, dores e funerais são lembretes constantes e comuns de que fazemos parte de uma raça caída. E aguardamos um novo céu e uma nova terra onde não mais haverá sofrimento comum.
- Existe também o sofrimento corretivo.
Essa é a disciplina do crente, conforme ensinado em Hebreus, capítulo 12.
- Daí, existe o sofrimento construtivo.
Esse é o sofrimento que produz crescimento e maturidade espiritual no crente, conforme Tiago capítulo 1 nos mostra. Até mesmo o Senhor Jesus, quando homem, de acordo com Hebreus 5, verso 8b: aprendeu a obediência pelas coisas que sofreu
- Finalmente, existe o sofrimento para a glória de Cristo.
Esse é o sofrimento que permite com que a glória de Deus seja revelada. E foi esse tipo de sofrimento que Paulo teve aqui em Atos 28.
Uma Revelação de Poder
Agora, prepare-se para mais uma revelação de poder apostólico que glorificou a Cristo. Veja os versos 7 a 10.
Perto daquele lugar, havia um sítio pertencente ao homem principal da ilha, chamado Públio, o qual nos recebeu e hospedou benignamente por três dias. Aconteceu achar-se enfermo de disenteria, ardendo em febre, o pai de Públio. Paulo foi visitá-lo, e, orando, impôs-lhe as mãos, e o curou.
(A propósito, esse poder de curar também era uma validação do apóstolo, como vemos em Hebreus 2, verso 4, e Marcos 16, verso 18.)
À vista deste acontecimento, os demais enfermos da ilha vieram e foram curados,
(Em outras palavras, quando Paulo deixou a ilha de Malta, o hospital ficou vazio; a doença havia sido erradicada.)
os quais nos distinguiram com muitas honrarias; e, tendo nós de prosseguir viagem, nos puseram a bordo tudo o que era necessário.
Então, Paulo executou seus dons apostólicos:
- Mordida de serpente não lhe causou dano;
- Pessoas doentes foram curadas.
Aplicação
Vamos fazer algumas aplicações desse texto especialmente para aqueles que se encontram naufragados em ilhas desconhecidas e eventos imprevistos ou não planejados que afetam suas vidas.
- Às vezes, Deus envia encorajamento no ambiente que menos esperamos.
Paulo esperou ser encorajado na sua chegada a Roma e não num naufrágio na ilha de Malta.
Se estivéssemos no lugar de Paulo, estaríamos nos aquentando ao lado do fogo, dizendo: “Certo, Senhor, me diga quais os teus planos – não estou entendendo.”
Não houve nenhuma resposta do céu, mas não demorou muito para Paulo se aquecer nessa hospitalidade fenícia e descobrir que o povo estava pronto para ouvir o evangelho de Cristo.
Se olharmos para o ministério passado de Paulo, veremos que, cada cidade em que Paulo entrou, ele foi expulso, apedrejado, espancado, maltratado... mas, não em Malta. E os momentos finais de Paulo com esses fenícios são facilmente ignorados por nós. Vamos voltar, então, a esse momento raro na vida de Paulo. Veja o verso 10.
os quais nos distinguiram com muitas honrarias; e, tendo nós de prosseguir viagem, nos puseram a bordo tudo o que era necessário.
Esse foi um encorajamento enviado por Deus num local mais inusitado e de uma fonte menos esperada.
- Às vezes, Deus exige disposição e confiança nos momentos em que estamos mais despreparados.
Confiança foi posta em Deus durante a tempestade e depois da mordida da serpente. Agora, creio que a maioria de nós não passaria por aquela cena da mesma forma como Paulo passou; mas, a pergunta permanece: o que em sua vida desafia sua fé no cuidado e providência de Deus? Quando é que você se sente mais despreparado para as manobras e mudanças da vida?
Suponha que Paulo tivesse colocado na porta de seu quarto a mensagem: “Não incomode!” ou “Deixe-me em paz – não quero estar aqui nesta ilha – eu quero ir para Roma.” Ele teria perdido a oportunidade; ele não teria servido as outras pessoas e, no final, não teria sido ricamente servido.
E isso nos conduz à aplicação final.
- Às vezes, Deus produz fruto nos campos mais inusitados.
Paulo ministrou às pessoas nos momentos em que poderia ter ido à praia para esperar o próximo navio chegar ou a próxima ordem do comandante. Além disso, Deus já tinha deixado bastante claro que Paulo chegaria a Roma – o verdadeiro ministério ocorreria diante do imperador.
Quantos homens, em seu caminho ao imperador, se importariam a falar aos bárbaros?
Sinceramente, Malta não fazia parte do mapa ministerial de Paulo. Não sabemos quanto tempo as pessoas dessa ilha passariam sem ouvir o evangelho, caso Paulo tivesse permanecido em silêncio.
E Paulo poderia facilmente justificar seu silêncio: “Ah, com certeza, esses primitivos não estariam interessados no evangelho mesmo. Eles são pagãos com suas superstições fenícias. Jamais ouviriam a conversa sobre um Deus verdadeiro e sobre o nosso Salvador Jesus Cristo.”
Para você, talvez esses nativos representem um familiar seu, ou um colega de trabalho, ou uma criança, ou ainda um vizinho – jamais eles se interessariam pelo assunto. Mas Paulo se dispôs a se envolver com pessoas num local que nunca tinha considerado antes.
De acordo com a história da igreja, uma igreja local na ilha de Malta é datada daquele período em que Paulo esteve na ilha. Até o presente, na verdade, o local onde Paulo e seus companheiros nadaram até a praia é chamado de Bahia de São Paulo. E, a propósito, os historiadores registram que o primeiro pastor da igreja em Malta foi um homem chamado Públio.
Então, essa ilha estranha cheia de naufragados se tornou, de fato, uma ilha de refúgio, de ministério, de encorajamento e de fruto espiritual.
Este manuscrito pertence a Stephen Davey, pregado no dia 04/10/1998
© Copyright 1998 Stephen Davey
Todos os direitos reservados
Add a Comment